A saga de um síndico (episódio 1)

Vamos contar em quatro capítulos a saga do síndico de um condomínio de 140 apartamentos. No primeiro capítulo, a história é com João Carlos e Tânia, um casal que acaba de comprar o seu primeiro “apê”.

Era uma Vez (como toda boa história, começamos com um)… João Carlos e Tânia se preparavam para casar e decidiram que o primeiro passo seria comprar um apartamento.

Depois de muito pesquisar encontraram um que estava dentro do que podiam gastar. O prédio seria entregue em pouco tempo, o suficiente para se casarem e entrarem para a casa nova.

Pouco tempo antes da entrega, foram chamados pela construtora para uma reunião de proprietários, onde seria definido, entre outras coisas o primeiro síndico, aquele que seria responsável por gerir o condomínio no primeiro ano.

Em determinado momento da reunião o engenheiro da construtora que conduzia os trabalhos informou que era chegada a hora de se escolher um síndico para o primeiro ano de funcionamento do condomínio.

Os presentes se entreolharam, mas ninguém se manifestou. Foi aí que João Carlos se encheu de coragem e tomou uma decisão:

– Querida acho que vou me candidatar.

– Faz isso não. Que experiência você tem para ser síndico? Nunca morou num condomínio, você não consegue nem tomar conta das suas coisas direito, vai querer ser síndico.

– Mas amor, como síndico, já foi dito que não pagaremos condomínio, e você sabe que qualquer economia é bem-vinda agora que estamos começando nossa vida.

– Você acha que compensa?

– Acho.

– Você é quem sabe.

João Carlos se encheu de coragem e se levantou

– Eu aceito ser o síndico.

Todos o olharam com uma expressão de alívio e, uma salva de palmas invadiu o recinto. Estava eleito, ou escolhido, o primeiro síndico do Condomínio Céu Azul.

João Carlos saiu da reunião se sentindo poderoso, afinal iria comandar os destinos de um condomínio com 140 apartamentos.

Ele tinha 25 anos, trabalhava na TI de uma empresa de logística, tinha formação superior e, muita vontade de crescer no emprego. Gostava de frequentar uma academia e de ir a barzinhos com a esposa, nos finais de semana.

Não tinha costume de ler jornais, ouvir noticiários no rádio e assistir telejornais, embora as vezes se pegasse fazendo isso. Se interessava mais em ler notícias ligadas à sua área de formação e trabalho. Aos sábados pela manhã ia com a turma do trabalho jogar bola, a tradicional pelada dos finais e semana.

Tinha como maior objetivo se tornar expert na sua profissão. Por vezes chegava em casa e depois de um banho e jantar, se sentava à frente do computador e buscava conhecer novas técnicas. Era tão interessado no que fazia que se esquecia da hora e quando olhava o relógio, já era madrugada.

Vivendo a realidade

Pouco tempo depois da reunião na construtora, João Carlos e Tânia estavam em seu novo apartamento. Dois dias haviam se passado e eles ainda estavam arrumando as coisas, pondo os móveis e roupas nos lugares, quando o interfone tocou.

– Alô, pois não.

– É do apartamento do síndico?

– Sim, sou eu.

– Seguinte, me mudei ontem para cá, e acredita que já tem gente usando minha garagem. Você tem que dar um jeito. Procura essa pessoa, e manda ele tirar o carro de lá.

– O senhor por acaso sabe de quem é o carro?

– Não, e quem tem que descobrir isso e tomar as providencias é você que é o síndico.

– Tudo bem. Pode ficar calmo que vou resolver isso.

– Assim espero.

– Amor, vou ter que ir lá no estacionamento resolver um problema de garagem e não demoro.

– Mas tem que ser agora? Você está me ajudando com os móveis aqui em casa. Deixa isso para depois.

– Não posso, sou o síndico e tenho que resolver isso agora, senão o morador vai me encher o saco.

– Eu te falei que esse negócio de síndico não ia dar certo, mas você quis, né.

– É coisa à toa, já já estou de volta. Depois isso não vai acontecer toda hora. Já deu para notar que o pessoal aqui é tranquilo. Já fiz até amizades e, todos disseram que vão me ajudar sempre que precisar. Vai ser tranquilo e, vou marcar meu nome na história desse condomínio.

É, mas não foi bem assim…

Os meses que se seguiram mostraram a João Carlos a dura realidade de ser síndico. Cada dia um problema novo, uma reclamação: era cocô de cachorro nas passarelas, morador usando garagem do outro, som alto, menino brigando com outro, festa no espaço Gourmet, que não respeita o horário para acabar.

Na hora de fazer as contas para pagar as despesas do condomínio, se não faltava, o dinheiro era a conta certa.

João Carlos descobriu que o valor estipulado para pagamento da taxa de condomínio agradara a todos porque era baixa, mas não era suficiente para as despesas que começavam a surgir e, para formar um fundo de reserva para obras emergenciais.

Aliado aos problemas do condomínio, tinha o trabalho. Ele conseguira a promoção por que tanto lutou e agora a responsabilidade aumentara e, o trabalho também.

Chegava em casa cansado, as vezes com mal humor e acabava discutindo com a esposa, que já não aguentava mais as pessoas reclamando do síndico.

Foi então que João Carlos tomou uma decisão: iria convocar uma assembleia para pedir o aumento do valor da taxa de condomínio. Quase se arrependeu de fazer isso, pois os moradores presentes só faltaram “bater nele”. Todos acharam um absurdo a proposta de aumento e, no final por decisão unânime, o valor continuou o mesmo.

Ele saiu da reunião decepcionado. Sentado à mesa na sua casa, ficou imaginando uma forma de diminuir a inadimplência e, fazer aumentar a receita do condomínio, mas por mais que tentasse não encontrava uma fórmula. Foi deitar já na madrugada do dia seguinte.

No trabalho comentou a situação com um colega, que lhe deu uma luz:

– Olha, lá no condomínio onde moro, entregamos o recebimento da taxa condominial para uma empresa administradora, e resolvemos o problema.

– Como funciona isso?

– Seguinte: a empresa se responsabiliza pelos valores. Todo mês, calculado o valor do condomínio, eles depositam na nossa conta a soma total, descontado a comissão que cobram, que pode variar de 5% a 6% e, ficam com a dívida. Independente do morador pagar ou não a taxa, o condomínio recebe.

– Cara, ta aí minha solução. Me passe o contato dessa administradora que vou ligar agora mesmo.

E foi o que fez. Conversou, pegou todos os detalhes e foi para casa. Tão logo chegou fez um aviso convocando uma reunião extraordinária para expor e votar o assunto.

No dia da assembleia, embora sem unanimidade, a proposta foi aprovada. João Carlos então fez contato com a administradora e assinou o contrato.

Fim dos problemas?

João Carlos pensou que agora teria paz para administrar o condomínio. Nada disso. É bem verdade que os problemas com o dinheiro foram resolvidos, mas a convivência com os condôminos estava ficando difícil.

Como trabalhava, não tinha tempo de ficar o tempo todo por conta dos problemas e, quando chegava em casa, recebia uma avalanche de reclamações.

Um dia, João Carlos chegou perto da Tânia e disse que não aguentava mais.

– Sabe amor, chega, não quero mais ser sindico. Não consigo ter paz. Chego cansado do trabalho e logo começam a ligar para cá, reclamando de tudo. Não tenho nem mais tempo de ficar com você, sairmos. Chega, para mim acabou.

– O que você vai fazer?

– Agora mesmo vou redigir uma convocação de assembleia para eleição de um novo síndico, afinal meu mandato está no fim mesmo.

– Mas e seus amigos que disseram que o ajudariam, não vão ficar decepcionados?

– Amigos? Só de papo. Nem nas assembleias eles aparecem para votar comigo.

No dia seguinte estava no quadro de avisos, a convocação para uma assembleia, em 30 dias, para eleição de um novo síndico.

Trinta dias que para João Carlos demoraram uma eternidade.

Passando o bastão

Eleito o novo síndico, João Carlos sentiu-se aliviado. Durante um ano ele tentou fazer o melhor para o condomínio, mas na hora das assembleias, dos 140 condôminos compareciam pouco mais de 10%, que decidiam e aprovavam os assuntos colocados em pauta.

No dia seguinte os outros 90% apareciam para reclamar do que foi decidido, e o alvo principal da crítica era sempre o síndico.

Chegaram a falar que ele estava se enriquecendo depois que assumiu a função.

Agora ele poderia ter paz em casa, sem ninguém ligando no interfone para reclamar. Só lamentou que nesse um ano, acabou fazendo muita inimizade, por causa das decisões que teve que tomar, sempre pensando no melhor para a comunidade de condôminos.

Fim da assembleia, seu Abílio estava eleito como síndico.

– Boa sorte meu amigo, espero que você possa fazer um trabalho melhor que o meu e, que fique muito tempo na função.